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Garantir abastecimento é desafio com desmonte de políticas para agricultura familiar

Garantir abastecimento é desafio com desmonte de políticas para agricultura familiar
Setor é responsável pela produção de 70% dos alimentos no país; para indústria e varejo não há risco de desabastecimento - Nara Lacerda Brasil de Fato



Agência Brasil

Frente a imagens de corrida aos supermercados e falta de produtos básicos nas prateleiras em diversos países por causa da pandemia do coronavírus, o setor produtivo brasileiro se apressou em dar garantias de que não haverá desabastecimento no país.
Desde que as transmissões comunitárias foram confirmadas no Brasil, varejistas, representantes da indústria e do campo vêm dando afirmações nesse sentido, mas sempre ressaltando que o comportamento do consumidor será definidor para a manutenção da normalidade.
Uma eventual corrida em massa às compras pode interferir na oferta de produtos, por isso, o consumo consciente se faz ainda mais necessário neste período. Não é preciso fazer grandes estoques, e o planejamento do que comprar deve obedecer às necessidades de cada grupo familiar, sem exageros.
Indústria e varejo
Com as políticas de isolamento social e flexibilização de horários de trabalho, alguns especialistas preveem mudanças na distribuição de bens. Pode ser que alguns produtos demorem mais a chegar ao consumidor final.
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) se manifestou recentemente sobre essa preocupação. Na análise da CNI, o setor está empenhado em encontrar soluções para manter o abastecimento, mas cabe ao governo atuar para atenuar restrições enfrentadas tanto na produção quanto no transporte de bens e produtos essenciais.
Em texto divulgado na semana passada, a Confederação apresenta ponderações sobre a cadeia produtiva. "O tratamento de água depende diretamente da disponibilidade de produtos químicos. A produção de alimentos requer insumos da mineração. Sem embalagens não é possível disponibilizar alimentos às pessoas. As cadeias de produção são complexas e qualquer julgamento equivocado sobre a 'essencialidade' de um determinado insumo pode interromper cadeias inteiras de fornecimento", diz um trecho do comunicado.
A Associação Brasileira da Indústria de Alimentos e a Associação Brasileira de Supermercados atuam juntas em um comitê de crise, que monitora o abastecimento de alimentos no país diariamente.  Segundo as duas instituições, a logística de abastecimento e os estoques estão dentro da normalidade.
O supermercados  estão preparados até mesmo para aumentar o abastecimento, caso seja necessário. Algumas lojas estabeleceram limite de compras e até mesmo controle de entrada de clientes, medida que também tem como objetivo evitar a propagação do vírus.
Situação do campo
No campo, o trabalho segue entre os produtores da agricultura familiar, responsáveis por mais de 70% dos alimentos que chegam à mesa dos brasileiros. Ademar Ludwig, um dos coordenadores do grupo gestor da rede Armazém do Campo, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), afirma que o trabalhador camponês não vai parar a produção, mas ressalta os desafios logísticos que podem surgir durante a crise da pandemia.  
Ele traz o exemplo dos armazéns, que trabalharam na preparação e planejamento de estoques para o período atual. A rede conta com lojas em São Paulo (SP), Porto Alegre (RS), Belo Horizonte (MG), Rio de Janeiro (RJ), Caruaru (PE), Recife (PE) e São Luiz (MA).
“Os agricultores não vão parar sua produção. Os nossos camponeses continuam sua vida normal, mantêm seu planejamento. O que nos preocupa é que, infelizmente, a logística ainda é muito concentrada no país. Uma corrida desenfreada dos grandes supermercados, por exemplo, poderia causar atraso em entregas, porque nós dependemos de um transporte quase 100% rodoviário e controlado por grandes empresas. Mas não seria um atraso de mais de cinco dez dias, como mostra a nossa experiência nos armazéns do MST. No nosso caso, a gente se planejou, os armazéns do MST estão preparados", garante.
Maria Caze, da direção nacional do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) e que atua no Coletivo de Abastecimento Popular, reafirma a capacidade de produção,  por meio de uma análise da própria cadeia produtiva brasileira.
“A produção de alimentos, a partir da produção camponesa, da agricultura familiar, da agricultura quilombola e indígena, se mantém no Brasil. Nós temos um país continental , com períodos e momentos de plantio diferentes. Nesse sentido, nós temos regiões que estão em plena colheita, regiões que estão se preparando para o plantio e regiões que vêm saindo de uma seca violenta, como é o caso de alguns lugares da região sul. Essa é a hoje a situação produtiva do campesinato. Nós temos que fazer esse alimento chegar à mesa do povo, e essa é hoje nossa principal preocupação", diz a representante dos pequenos produtores. 
Ainda de acordo com Maria Caze, o maior desafio do momento, é garantir o abastecimento frente a uma economia que já estava estagnada e a estruturas de proteção à agricultura familiar que vinham sendo desmontadas.
“Não podemos deixar de dizer que a chegada dessa pandemia, em um momento em que o Brasil vive um período de estagnação econômica, fruto de um desgoverno e de suas ações neoliberais, em que nossas estruturas são desmontadas e destruídas. Esse é o cenário que nos encontra a covid -19. Isso também traz um prejuízo enorme para o campesinato dar conta da sua missão que é produção de alimentos. Essa é, de fato, a dificuldade que é colocada para o campesinato", ressalta.
Mudanças na rotina do consumidor
Enquanto a cadeia produtiva trabalha em soluções para garantir o abastecimento, a importância do papel do consumidor cresce. A ida em massa aos supermercados, por exemplo, causa impacto não só na oferta de produtos, mas é também é um comportamento que pode ser determinante para a expansão do coronavírus.
A Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) preparou uma espécie de guia para a ida às compras nesse período. As medidas de prevenção foram elencadas pelo professor do Departamento Microbiologia, Imunologia e Parasitologia da UFSC, Oscar Bruña-Romero. O básico é escolher horários em que as lojas estejam mais vazias e redobrar os cuidados com a higiene. Confira também as outras recomendações apresentadas no manual:
1. Nunca fique a menos de um metro de outro ser humano;
2. Considere sempre a sua mão suja. Nunca leve a mão à boca, ao olho ou nariz enquanto estiver no mercado, nem para coçar, nem para tocar nos cabelos;
3. Pague suas compras no cartão. Não aceite moedas e muito menos notas de papel até depois da pandemia;
4. Guarde álcool em gel e álcool 70% com um rolo de papel toalha no carro. Coloque as compras no porta-malas e, em seguida, abra a porta do carro e passe álcool gel na mão (ainda fora do veículo). Molhe uma folha de papel toalha com álcool 70% e passe no volante, no freio de mão e na alavanca das marchas. Passe também na maçaneta (alavanca) da porta de dentro do carro, nos controles dos vidros e nos controles do rádio. Não faça desinfecção do carro por fora, é necessário sempre considerar que o veículo possa estar contaminado. Feche a porta, sente-se e desfrute a viagem;
5. Higienize os alimentos ao chegar em casa, principalmente aqueles que serão consumidos crus. Lave em água corrente e mergulhe as verduras e frutas em uma solução contendo água sanitária diluída em água. Observe no rótulo da água sanitária a diluição ideal e o tempo necessário para deixar o alimento em imersão. Se não tiver essa informação no rótulo, busque outra marca, pois alguns produtos não devem ser utilizados em alimentos. Depois disso, enxágue com bastante água. Passe álcool 70% em embalagens de alimentos que serão armazenadas.;
6. Caso tenha comprado itens que não são comestíveis, passe álcool 70% neles ou deixe ao sol direto por duas horas, no mínimo;
7. Sempre que chegar em casa da rua, tire os sapatos e troque a roupa. Lave os braços até o cotovelo. É fundamental ter uma ‘roupa de casa’, e a ‘roupa de rua’. Se não quiser lavar diariamente, deixe sempre no mesmo lugar. Volte a vesti-la apenas imediatamente antes de necessitar sair para a rua novamente. Não transite em casa com ‘roupa de rua’.
 

Edição: Geisa Marques e Leandro Melito 

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